Adaptação escolar para pais ou crianças?

_MG_3655

Foto: André Moura

 

Uma reflexão sobre os sentimentos no período da adaptação escolar de nossos filhos.

É sabido que o ser humano tem uma capacidade inesgotável de se adaptar, sobretudo nas situações mais adversas em suas vidas. Mas, vivenciar de perto e sem sofrimento a primeira adaptação escolar de nossos pequenos não é tarefa fácil ou sem culpa – seja quando esses são bebês ainda menores de seis meses e precisam ir para creches para que suas mães voltem a rotina de trabalho ou até mesmo com crianças já no ensino fundamental que os pais decidiram mudar de escola. O ingresso num novo ambiente escolar cheio de estímulos e desafios, chamado por muitos especialistas de segundo espaço de socialização da criança depois da família, é uma experiência que traz sentimentos ambíguos nos pais e nas crianças. E é por isso que muitas escolas chegam a dizer que a adaptação escolar é para os pais e não para as crianças. Colocação que tendo a discordar. A adaptação é, aos meus olhos, para todos: pais- que revivem ali sua experiência escolar, crianças- que precisam se sentir segura para vincular e a própria escola em relação àquela nova família e a criança que estão recebendo, mas, ainda desconhecem.

Desde a segunda semana de fevereiro tenho experimentado, pela primeira vez no outro lado, o papel de mãe adaptando a filha de 2 anos e confesso que não tem sido fácil para ninguém, mesmo com todo apoio e carinho que temos recebido da instituição. Apesar de já ter passado por inúmeras adaptações nos 9 anos em que fui professora pré escolar não estava preparada para minha hora de dizer tchau. Pasmem! A decisão, o momento ideal e escolha da escola estão super acertadas dentro de mim. Visitei inúmeras escolas, fiz uma escolha que não funcionou um ano antes e voltei atrás, esperei até os 1000 dias completos da pequena para esse momento. Compramos uniforme, conversamos sobre esse novo espaço, vimos filmes que mostravam crianças nas escolas, preparamos o lanche a ser levado, mas na hora H o coração aperta ao ver aquele ser tão pequeninho e que protegemos e amamos tanto com olhos desconfiados agarrados em nosso colo. Apesar de termos a certeza que eles irão se divertir, fazer amigos, ter a chance de amar e ser amados por outras pessoas que não são familiares nos sentimos péssimos quando eles abrem o choro e se recusam a ficar nesse novo espaço que escolhemos com tanto zelo.

As outras mães, das crianças que no primeiro dia deram tchauzinho com suas pequenas mãos e um sorriso estampado no rosto, dizem que a facilidade e rapidez da adaptação também não foi tranquila de lidar porque quando a criança pula de braços abertos no colo de outra de alguma forma as faz sentir não tão indispensáveis assim e isso também dói. Tudo que tenho a dizer então é que ser mãe não é moleza e o pior é querer acreditar e fazer valer a bela frase que diz que “A boa mãe é aquela que vai se tornando desnecessária com o passar do tempo”.

Nosso instinto materno protetor e a vontade de colocar nosso rebento debaixo de nossa asa sob nossos cuidados e protegidos de todo e qualquer sofrimento para sempre é um desejo não só egoísta como uma tarefa interna quixotesca. Dar a luz ou a vida é antes de qualquer coisa colocar nossos filhos no mundo e irmos aos poucos nos tornando desnecessárias para que eles próprios consigam seguir confiantes seu caminho com a segurança necessária de que estaremos ali os apoiando no que for preciso e na escolha que fizerem. Isso é ser uma mãe suficientemente boa como diria Winnicott. Mas, não é fácil tornar-se desnecessária, confesso.

A cada fase da vida de nossos filhos precisamos nos separar e nos diferenciar para ir aos poucos cortando o famoso cordão umbilical. A primeira separação é, sem dúvida, o nascimento que apesar de tão desejado traz a mãe um sentimento de vazio, pois aquela sensação de completude e a experiência de estar sempre acompanhada pela barriga com o bebê mexendo lá dentro acabam e uma nova fase de adaptação e provação se inicia. O mesmo acontece com o desmame por mais que tenhamos preparado tudo para o processo acontecer da melhor forma possível. O que devemos então ter sempre em mente é que cada um tem um tempo único e uma forma singular de se adaptar as novidades e que a cada nova fase uma perda e um ganho acontecem naturalmente para pais e filhos. Idas e vindas também fazem parte do processo.

Com a adaptação escolar não tem como ser diferente. Uns chegam de mãos dadas com os pais e logo dizem adeus e seguem confiantes no novo espaço. Outros experimentam aquelas relações em doses homeopáticas e no silêncio e um dia decidem ficar seguros ali sem a presença dos pais e há ainda os que choram e gritam para se adaptar mesmo demonstrando no olhar e no sorriso que ali querem ficar. Cada caso é um caso e no final tod@s as crianças acabam se adaptando e ganhando mais do que perdendo com a experiência de escolarização. E para nós pais o que tenho é dizer é: segura o choro porque a hora do tchau vai chegar para tod@s nós mais cedo ou mais tarde nos trazendo não somente mais horas matutinas ou vespertinas livres como também a possibilidade de nos reencontramos com nós mesmos. Bem vind@s a vida escolar!

Deixe um comentário